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sexta-feira, 27 de setembro de 2013

TROCANDO OLHARES


A 10 de Maio de 1915, Florbela inicia um caderno a que chama
 «Trocando Olhares», e onde vai guardando a sua produção em poesia
 e em prosa. Devido às dificuldades económicas que enfrenta na altura
 e que a obrigam a mudar-se, com o primeiro marido, Alberto Moutinho,
 para a casa do pai, Florbela, juntamente com ele, passa a dar aulas
 num colégio; em virtude de todos estes problemas, interrompe a
escrita do caderno, que apenas retoma em Novembro. Num ano e meio,
 Florbela escreve 144 poesias, uma dedicatória em verso e três contos,
 «A Oferta do Destino», «Amor de Sacrifício» e «Alma de Mulher»,
 mas apenas quatro poesias virão a ser publicadas. «Trocando Olhares» 
engloba também «O Livro D’Ele», «A Minha Terra» e «O Meu Amor».

«Trocando Olhares» é um livro que evidencia uma certa dispersão,
 embora seja bastante ambicioso, conseguindo alguns pormenores
 estilísticos bem achados, como a primorosa abertura do soneto 
«Crisântemos» e as quadras de «Saudades e Amarguras». 
Referência, igualmente, à influência da poesia neo-romântica,
 que surge nesta obra tocada de um certo casticismo, e evoluindo
 claramente do decadentismo de fim de século, presente através
do soneto «A Doida», mas que não tem seguimento neste 
«Trocando Olhares».

Em termos estilísticos, Florbela dá ainda primazia às quadras isoladas
 ou aos conjuntos de quadras, embora o papel do soneto ganhe já algum
 destaque, quase dominando o último quarto da obra.

No aspecto temático, Florbela aborda desde já o papel do amor, a sua
 importância, e a sua faceta de religiosidade, a par da tristeza de 
ser poeta, bem patente em «Saudades e Amarguras» e «Poetas»; revela 
também um acentuado desejo de evasão (ao jeito neo-romântico, como 
se vê em «Nunca Mais!»), ao lado de uma consciência firme de um 
destino pouco venturoso, como se constata em «O fado». Além disso,
 a poetisa manifesta um enorme fervor patriótico, tematizando o 
seu país e o deslumbramento que sente ao olhá-lo em sonetos como
 «Paisagem» ou nas quadras «No Minho», em que passeia pelo pitoresco
 dos lugares tradicionais. Ao mesmo tempo que se tenta libertar de
um tom confessional, Florbela mostra já sinais da emancipação 
iterária feminina que, mais tarde, preparará: subverte o erotismo
 tradicional, centrado no masculino, para um erotismo em que o eu
feminino da poetisa se afirma cada vez mais.

Em suma, já em «Trocando Olhares», Florbela se mostra uma poetisa 
muito singular, a anunciar uma Florbela mais madura. 


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